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Foto do escritorFelipe Caltabiano

Lei da Agrofloresta #3 - SEMPRE BUSQUE ESPÉCIES MAIS EFICIENTES

Atualizado: 28 de ago. de 2020


Cada espécie existente neste planeta possui as ferramentas para modificar o ambiente à sua volta. Em um ecossistema saudável, as espécies presentes irão modificá-lo de modo a torná-lo mais rico, com maior disponibilidade de recursos para todos os seres presente. O incremente de recursos em um ecossistema é possível devido à presença de seres fotossintetizantes, que capturam carbono atmosférico, energia solar e produzem açucares.

Sabendo disso, dentro do trabalho com Sistemas Agroflorestais, você deve sempre “Mirar no Seu Teto Fotossintético”, como discutido na semana passada. Isso quer dizer que deve buscar elevar as taxas de fotossíntese no seu sistema, lançando mão de algumas estratégias para isso:

· Adensamento de plantio

· Boa nutrição das plantas

· Podas realizadas com uma ótima frequência

· Estratificação das espécies

· Sucessão de espécies

· Escolha de espécies

Esta última estratégia é o motivo para o artigo de hoje.

Em primeiro lugar, vamos nivelar o assunto deixando claro o que quero dizer com “eficiência” e “eficácia”, duas palavras comumente confundidas.

Eficiência – produzir o máximo de determinado resultado, com o mínimo de insumos

Eficácia – produzir aquilo que terá o efeito desejado

Pois bem, veja que eficácia se refere ao QUE fazer, enquanto eficiência se refere à COMO fazer. Um simples exemplo: se o cidadão A é extremamente eficiente ao buscar água no rio, 20 vezes ao dia, conseguindo carregar um balde de água em cada mão e outro na cabeça, o cidadão B (que não teria nem 10% desta eficiência), é extremamente eficaz ao botar uma calha no telhado e um encanamento para armazenar água da chuva, e portanto não ter de ir ao rio, nem sequer se preocupar com buscar água em lugar nenhum.

Eficiência se refere a alta produtividade, mas sem eficácia, esta produtividade pode ser inútil. Por isso, nos nossos sistemas agroflorestais, queremos buscar espécies mais eficientes e mais eficazes.

Por exemplo: Commelina benghalensis (vulga Marianinha ou Trapoeraba) é uma espécie altamente eficiente, pois é capaz de vegetar, se reproduzir e tomar conta de qualquer território que lhe forneça seus requisites mínimos de água e nutrição. É muito mais eficiente do que um alface ou uma beterraba, quando o assunto é propagação e produção de matéria verde. Agora, é eficaz? Depende do propósito do seu Sistema Agroflorestal. Se você está formando pastos para a criação de aves, ela é sim eficaz, pois vai cumprir a função de alimentar as suas aves com esplendor. Agora, se o meu propósito é produção de matéria orgânica, Commelina não é nada eficaz, pois ela não se comporta da maneira ideal para que eu possa manejá-la.

Uma planta para produção de biomassa precisa ser manejável! Eu preciso conseguir podá-la. Commelina não é podável, devido ao seu porte rasteiro. Portanto, não é nada eficaz eu tê-la no meu sistema, já que o QUE preciso fazer é podar e botar matéria orgânica no chão. O nosso querido capim mombaça (Panicum maximum) é altamente podável e mais produtivo do que Commelina. Ele é, portanto, mais eficaz e mais eficiente ao mesmo tempo. Não é a toa que ganhou a importância que ganhou dentre os agrofloresteiros do Brasil e do mundo.

Sabendo que há aproximadamente 320 mil espécies no reino Plantae, você deve sempre estar buscando e experimentando com novas espécies, tentando encontrar aquelas mais eficazes, ou seja, aquelas que irão realizar as funções necessárias para o modelo de sistema que você está conduzindo. E as mais eficientes, ou seja, aqueles que, com os recursos disponíveis, irão realizar a máxima quantidade destas funções necessárias.

Estamos bem habituados à dupla dinâmica: Eucalipto e Banana, pois realmente são espécies implacáveis, quando o assunto é produção de matéria orgânica e facilidade de manejo. Mas eu sempre recomendo que as pessoas experimentem com espécies diferentes, que estejam sempre botando à prova as espécies que já estão sendo utilizadas.

Particularmente, nos meus sistemas atuais, não estou utilizando eucaliptos, devido à dificuldade de obtenção de mudas na minha região. Mas encontrei espécies nativas que não ficam muito para trás, quando o assunto é produção de matéria orgânica e rápido crescimento. Na região de Lençóis, BA, temos 4 espécies nativas de destaque (todas são encontradas em diversas outras regiões do Brasil):

· Pterogyne nites – Vilão, Amendoim Bravo, Madeira Nova

· Senna spectabilis – São João, Cassia do Sertão

· Guazuma ulmifolia – Mutamba preta

· Trema micanthra – Grandiúva, Pau-pólvora

Considero que tive a “sorte” de, durante 3 anos, ter tido péssimas experiências com eucaliptos aqui em Lençóis. Em Brasília tive ótimas experiências, mas aqui em Lençóis tenho pés de eucalipto de 4 anos de idade que não são mais grossos do que um cabo de ferramenta e são pouco mais altos do que eu, quando já deveriam estar atingindo os 15-20cm de diâmetro e 10m de altura.

Esses fracassos me fizeram olhar para outras espécies, que talvez tivessem passado despercebidas. Por isso, considero este fracasso uma coisa boa. Certo que não experimentei mais do que 2, das 700 espécies de eucaliptos existentes. E, seguindo esta própria lei, vou experimentar outras espécies para ver se encontro alguma que funcione aqui. Minha próxima tentativa será o E. dunnii.

É importante entender uma coisa, quando pensando em eficácia e eficiência de espécies: na é escrito em pedra. Como você pôde ver com a minha anedota do eucalipto, se eu tivesse sido cabeça dura e insistido no que havia dado certo em Brasília e diversas outras partes do país e do mundo, não teria tido sucesso com as outras espécies.

A escolha das espécies vai variar de acordo com, clima, solo, disponibilidade de material propagativo, estado de degradação do ecossistema local. Por isso deve-se tomar muito cuidado em replicar “receitas de agrofloresta” sem uma análise mais profunda.

Você deve estar sempre questionando e buscando aperfeiçoar aquilo que já deu certo. Deve estar sempre buscando espécies mais eficientes e mais eficazes, seja na sua região ou do outro lado do globo. Por isso, deve ter uma mente aberta e estar disposto a utilizar espécies novas.

Ernst Götsch sempre reforça o fato de que quando um ecossistema entra em degradação, muitas vezes as espécies nativas daquele ecossistema já não são capazes de realizar o trabalho necessário para manter o balanço e fertilidade locais. Por isso devemos buscar espécies de ecossistemas parecidos, porém naturalmente mais pobres em água e/ou nutrientes. As espécies locais muitas vezes não são eficazes nas novas condições locais, devido ao processo de empobrecimento.

Esse é um dos motivos pelo qual ouvimos tantas reclamações de espécies “invasivas”. Eucalipto, leucena, Pinus, margaridão, são temidas por muitos, por se tratarem de espécies exóticas, com uma eficácia ENORME nas condições brasileiras. Essas espécies fazem o que precisa ser feito para enriquecer ecossistemas. São eficazes E eficientes, muito mais do que as espécies nativas. Porém, assim que as condições de solo melhoram, à partir de um sistema agroflorestal bem conduzido, estas espécies já não tem mais espaço.

Por isso, não tenha medo de lançar mão das temidas espécies invasivas. Esqueça aquela história que algum ambientalista te contou de que espécies exóticas são ruins para os nossos ecossistemas. Busque espécies eficientes e eficazes, para a presente condição climática e de fertilidade do seu campo, independente de sua proveniência.

E muito convenientemente, próxima lei: NÃO SEJA RACISTA.

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